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Como a universidade pública e gratuita aumenta a desigualdade de renda


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Como a universidade pública e gratuita aumenta a desigualdade de renda

 

por Carlos Góes - 23/07/2015

 

Existe um grande paradoxo na realidade política brasileira. Aqueles que usualmente se colocam como defensores da justiça social e dos mais vulneráveis, normalmente também entendem que as universidades públicas devem ser financiadas do modo que são hoje: com dinheiro de impostos. Tentativas de financiamento privado da universidade pública – por meio de empresas e fundações privadas – ou de cobrança de taxas de mensalidade e matrícula para os estudantes mais abastados – como tentou fazer, durante algum tempo, a UFMG – são rechaçados como métodos de privatização da universidade pública, gratuita e de qualidade.

 

Mas por que essa justaposição de defesas seria um paradoxo? A realidade é que, quando se olha para os dados do conjunto dos estudantes de universidades públicas brasileiras, observa-se que estas tendem a beneficiar os ricos de forma desproporcional. Por causa da alta concorrência das universidades públicas e da baixa qualidade das escolas públicas brasileiras, aqueles em situação econômica mais vulnerável têm pouca chance de conseguir uma vaga para estudar em uma universidade financiada pelo contribuinte.

 

Os dados da Pesquisa Nacional de Amostra de Domicílios do IBGE mostram a realidade dessa distorção. Usando os critérios de classe desenhados pela Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República, a classe alta corresponde a 24,8% da população.

 

Mas, nas universidades públicas, a classe alta ocupa 45,5% das vagas. Do outro lado dessa equação, as pessoas que estão hoje na classe baixa são 23,1% da população brasileira, mas apenas 8,4% da população universitária. Os dados estão expostos no gráfico abaixo (clique aqui para um gráfico com faixas de renda mais detalhadas).

 

uni.png

 

Note que esses dados são de 2013 – portanto, após os amplos ciclos de expansão das universidades federais e disseminação das políticas de ação afirmativa durante o governo Lula. Mesmo após esses processos, a universidade pública continua beneficiando primariamente os mais ricos. E isso acontece mesmo em países bem mais igualitários que o Brasil: mesmo na Noruega pobres têm dificuldade em chegar à universidade pública. Como pessoas com ensino superior tendem a ter salários maiores, essa distorção nas universidades públicas acaba financiando com impostos um sistema de aumento e perpetuação das desigualdades de renda.

 

Essa realidade estatística é algo que quem conhece universidades públicas já percebia intuitivamente. Certa vez, eu ouvi um professor da Universidade de Brasília dizer algo que esses dados confirmam: as universidades do governo são universidades estatais, mas não universidades públicas. Elas são universidades que, apesar de utilizarem recursos do estado, beneficiam primariamente aqueles que estão nas faixas mais altas de renda.

 

Existe um problema adicional nessa questão. De acordo com dados da OCDE, enquanto o governo brasileiro gasta cerca de 11 mil dólares por cada estudante de uma universidade pública, o gasto com cada estudante de ensino médio é cerca de 2.700 dólares. Ou seja, para cada estudante que é financiado pelo governo para frequentar o ensino superior, seria possível financiar quatro estudantes no ensino médio. Isso é muito importante porque, como mostram dados do IBGE, a maioria das pessoas que estão entre os mais 20% mais pobres do Brasil sequer termina o ensino fundamental.

 

Subsidiar a educação superior dos mais ricos enquanto os mais pobres sequer terminam os ensinos fundamental e médio resulta em transferência de renda dos mais pobres para os mais ricos. Por isso, as universidades públicas brasileiras são um dos mais importantes mecanismos de perpetuação das desigualdades de renda que já existiu na história brasileira. Enquanto os filhos da elite são educados com o dinheiro dos contribuintes (no Brasil, majoritariamente negros e pobres), os filhos dos mais pobres terão pouquíssimas chances de conseguir entrar na universidade pública.

 

Uma alternativa óbvia é mudar o foco do investimento público da educação superior para a educação de base: pré-escolar, primária e secundária. James Heckman, prêmio Nobel em Economia, coletou dados durante cinquenta anos e demonstrou que os retornos ao investimento em educação, em termos econômicos para a sociedade e cognitivos para as crianças, são maiores quando esses investimentos são direcionados à educação de base – em especial na primeira infância.

 

Por isso, no lugar de criar programas que mandem os filhos dos ricos estudar no exterior com o dinheiro de impostos – com o Ciência Sem Fronteiras – o governo federal poderia recordar de uma promessa de campanha da Presidenta Dilma e pagar bolsas de estudo para estudantes pobres estudarem em boas escolas particulares. Além disso, para horror dos puristas, o governo poderia cobrar uma mensalidade daqueles estudantes que podem pagar – como acontece por exemplo nas universidades públicas dos Estados Unidos, onde a bolsa recebida é proporcional à renda familiar do aluno – e usar esse orçamento para incentivar a educação pré-escolar, o que garantiria melhores índices escolares para as crianças no ensino fundamental e médio e facilitaria a inserção das mulheres – em especial mães solteiras – no mercado de trabalho.

 

Talvez você tenha torcido o nariz ao ouvir algumas dessas propostas, mas seja pragmático e pense duas vezes. Apesar da sua paixão ideológica, a tal universidade “pública, gratuita e de qualidade”, na verdade, está ajudando a fomentar uma sociedade desigual que você não gosta. Se você, como eu, realmente se preocupa com os mais pobres e com justiça social, você precisa ajudar a mudar essa situação. E, pra isso, precisa mudar de opinião.

 

Fonte: http://mercadopopular.org/2015/07/como-a-universidade-publica-e-gratuita-aumenta-a-desigualdade-de-renda

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Não faz isso cara, não tô com a menor vontade de escrever um texto enorme hoje :(.

 

Vou tentar ser breve:

O autor do texto reconhece a importância da universidade no posicionamento social. E eles sugere em algum ponto (não ao final) que não deveríamos ter universidades públicas. Será que ele acredita que o acesso será mais fácil (e que a qualidade será melhor) se tivermos apenas universidades privadas? Ou ele vai restringir ainda mais o grupo que tem acesso a universidades?

 

Em tempo, eu já falei aqui sobre o RU de não ver sentido quem não precisa também pagar o valor subsidiado do passe (que custa R$1,50 e deveria custar R$7,00). Não acho que cobrar valores anuais de quem tem condições de pagar seja um grande problema, desde que o dinheiro seja utilizado em melhorias para a universidade. É algo que poderia ser discutido.

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Ou seja, a solução que ele dá é enfiar um pouco mais a pica na bunda da classe média??

 

Já se paga MUITO IMPOSTO e a solução é pagar ainda mais taxas ao invés de fechar as torneiras dos desvios de verba...

 

E cada vez a conta fica mais alta...  Achei o texto muito fraco de argumento...

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Vou tentar ser breve:

O autor do texto reconhece a importância da universidade no posicionamento social. E eles sugere em algum ponto (não ao final) que não deveríamos ter universidades públicas. Será que ele acredita que o acesso será mais fácil (e que a qualidade será melhor) se tivermos apenas universidades privadas? Ou ele vai restringir ainda mais o grupo que tem acesso a universidades?

 

 

Não entendi assim. Entendi a sugestão de ou usar o dinheiro do Ciência Sem Fronteiras pra financiar a educação básica e/ou cobrar dos mais ricos que estudam em universidades federais e usar esse dinheiro para financiar a educação pré-escolar.

 

As idéias são boas mas não vejo isso funcionando na prática. As cotas sociais teriam maior chance de sucesso a curto e médio prazo.

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Não entendi assim. Entendi a sugestão de ou usar o dinheiro do Ciência Sem Fronteiras pra financiar a educação básica e/ou cobrar dos mais ricos que estudam em universidades federais e usar esse dinheiro para financiar a educação pré-escolar.

 

A verba seria muito melhor aplicada.

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O que foi exposto no texto é um fato. As propostas que são uma merda.

 

Nem isso. Não é verdade que as universidades públicas mantém a desigualdade, por um motivo simples (segundo ele): o curso universitário em muitos casos (não em todos) permite uma renda relativamente maior.

A partir disso ele deduz que a maioria é de classe alta e que por isso a desigualdade será aumentada. O que ele esquece é que o aluno de classe alta cursaria universidade particular. E os alunos de classes mais baixas (e muitos de classe média)? Quem da classe média tem condições de bancar R$5mil por mês em um curso de medicina?

 

Não entendi assim. Entendi a sugestão de ou usar o dinheiro do Ciência Sem Fronteiras pra financiar a educação básica e/ou cobrar dos mais ricos que estudam em universidades federais e usar esse dinheiro para financiar a educação pré-escolar.

 

As idéias são boas mas não vejo isso funcionando na prática. As cotas sociais teriam maior chance de sucesso a curto e médio prazo.

 

No final ele roeu a corda. Mas no começo a posição dá indicativos que não deveriam existir universidades públicas.

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No final ele roeu a corda. Mas no começo a posição dá indicativos que não deveriam existir universidades públicas.

 

 

Em todo caso, acho que a maior falha é propôr que a cobrança não seja na fonte. O meio mais fácil (e ainda longe da perfeição) pra classificar faixas sociais seria através do imposto de renda e não criar mais um imposto sobre consumo, o que acaretaria mais custos pra fazer o controle e ainda estaria sujeito a evasão.

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Instituir mensalidade nas universidades públicas só aumentaria a desigualdade. Mesmo que alguém diga "ahh, mas quem não tem condições de pagar teria bolsas". Obviamente, só os melhores alunos de baixa renda teriam bolsas, aumentando a já existente elitização da universidade pública. Além do mais, os interesses de pesquisa ficariam vinculados aos interesses de quem banca.

 

Claro que a solução está em investir no ensino de base, dando educação de qualidade e gratuita desde os primeiros anos de escola. Mas também seria tolice tirar orçamento das universidades para isso. É na universidade que está o grande desenvolvimento científico, e quem não desenvolve tem que gastar para importar.

 

Uma grande evolução que o Brasil precisaria implementar seria a filantropia. Inúmeros milionários dos EUA doam parte de suas fortunas para as universidades, em vida ou após a morte, e no Brasil isso é impossível.

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O que ele esquece é que o aluno de classe alta cursaria universidade particular.

 

Ou não. Melhor escola, melhor educação, maior chance de se pagar um cursinho e maior chance de entrar numa faculdade que é difícil de entrar.

 

Meu primo fez USP, ele não é pobre, nunca foi, sempre foi classe média, classe média alta, estudou em colégio particular, pode bancar cursinho, e entrou na Poli. Já na sala dele, 90% trocava de carro todo ano, já havia feito intercâmbio, viajado pra fora diversas vezes, estudou nos melhores colégios, etc.

 

90% da sala dele era constituida por RICOS de classe média alta ou altíssima.

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Ou não. Melhor escola, melhor educação, maior chance de se pagar um cursinho e maior chance de entrar numa faculdade que é difícil de entrar.

 

Meu primo fez USP, ele não é pobre, nunca foi, sempre foi classe média, classe média alta, estudou em colégio particular, pode bancar cursinho, e entrou na Poli. Já na sala dele, 90% trocava de carro todo ano, já havia feito intercâmbio, viajado pra fora diversas vezes, estudou nos melhores colégios, etc.

 

90% da sala dele era constituida por RICOS de classe média alta ou altíssima.

 

Isso no cenário de não existirem universidades públicas! A classe alta pagaria, uma parte da classe média pagaria, grande parte dos outros grupos ficaria com as uniesquinas ou sem faculdade.

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Isso no cenário de não existirem universidades públicas! A classe alta pagaria, uma parte da classe média pagaria, grande parte dos outros grupos ficaria com as uniesquinas ou sem faculdade.

 

Ah sim. Achei que você estava falando do cenário atual das universidades públicas. :)

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Tambem achei a solucao que ele da meio pobre mas achei que o tema valia o debate.

 

Nao sei como eh na faculdade de voces, mas pelo menos na minha e na minha anterior principalmente (UFRJ) a classe predominante era claramente media/alta. Principalmente em cursos mais concorridos (engenharias e medicina); so tinha playboy e patricinha que sempre estudaram em colegio particular e tiveram a chance de fazer um cursinho e claramente nunca tiveram que trabalhar. 

 

Negar que a realidade hoje eh essa eh fechar os olhos. 

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  • Vice-Presidente

A questão é que se mudar o jeito que é, a desigualdade só vai aumentar. Se de graça tem 20% dos mais pobres, imagina pagando?

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