Ir para conteúdo
  • Cadastre-se

Moralidade científica - é possível?


John the Baptist.

Posts Recomendados

Retomando um debate que eu já vi ser realizado algumas poucas vezes aqui no fórum, pensei em abrir esse tópico depois de vir um livro do Sam Harris na livraria, "A paisagem moral: como a ciência pode determinar os valores humanos". Conheço o autor desde o ótimo livro sobre livre arbítrio, mas essa investida dele no campo moral sempre me deixou meio, digamos, receoso. Ainda mais depois de ele falar a favor de uma suposta "Islamofobia", numa mesa redonda com o Ben Affleck e o Bill Maher, e da liberdade de "queimar o Corão ou qualquer outro livro e criticar Maomé ou qualquer outra pessoa"

O ponto central do livro é que é possível definir secular e cientificamente o que é moral e o que não é, bem e mal, certo e errado, etc. Basicamente, ele fala contra relativismos. Algumas críticas sobre o livro:

A paisagem moral
“Ao longo desse livro, argumentei que a cisão entre fatos e valores – e, portanto, entre ciência e moral – é uma ilusão. No entanto, a discussão se deu em pelo menos dois níveis: revisei dados científicos que, acredito, apoiam meu argumento; mas também apresentei uma proposta mais básica, filosófica, cuja validade não depende estritamente dos dados atuais.” pp 178.
Esse é um livro polêmico e não deveria se esperar nada diferente disso de um dos “quatro cavaleiros do apocalipse”. É preciso ter coragem para defender uma tese e depois torna-la um livro, sobre um assunto tão “delicado”: a moralidade é consequência da religião ou estamos biologicamente programados para desenvolvermos essa faculdade?
Sam Harris põe todas as suas fichas e seu argumento na segunda afirmação: a moralidade está (por assim dizer) em nosso DNA, milhões de anos de evolução fizeram com que nos tornássemos seres morais (quer dizer, fez com que 90% da população se tornassem morais). Se estiver em nossos genes a capacidade de “desenvolver” moralidade então, não precisamos de religião para que possamos definir as regras de certo ou errado, podemos usar a ciência, especificamente a neurologia para entender como grande parte das pessoas desenvolve noções de certo ou errado e porque uma minoria não.

Mas, ao dizermos que a “ciência pode identificar os mecanismos de certo e errado”, muitas pessoas dirão: e o que é certo e o que é errado? Ou uma versão mais “cínica”: o que é certo para mim pode não ser certo para os outros. Ou uma versão antropológica: o que é certo numa cultura pode não ser certo em outra. Para esses questionadores Harris propõe (como todo bom cientista) uma solução simples e elegante: o que é certo está baseado no bem estar das pessoas. E, antes que alguém troque, nas frases acima a palavra “certo” por “bem estar”, ele conclui o pensamento dizendo que o bem estar de uma pessoa se resume em que essa pessoa deve estar bem amparada: deve poder ir e vir, ter onde morar, acesso a saúde e educação independente de sexo ou classe social. A pessoa deve poder manifestar suas ideias sem ter medo de represálias, deve poder sair de casa sem ter que se preocupar (além do “normal”) com a roupa que veste, ou se está ou não acompanhada (coisa que não acontece nos países muçulmanos). Eu não vou entrar aqui, no debate “antropológico”, conheço um monte de gente que acha válido deixar tribos inteiras viverem no neolítico em nome da “preservação da cultura”.

Para essa noção de bem estar, a religião é, sem sombra de dúvida, a pior referência que alguém pode tomar para definir o que é bem estar ou não, logo, a religião também é péssima referência para definição de moralidade.
Nas trezentas e poucas paginas desse livro (ele é curtinho), Sam Harris faz uma detalhada explicação de como deveríamos adotar a ideia de uma moralidade científica e derruba um a um os argumentos levantados contra essa possibilidade. Como era de se esperar, ele faz duras criticas às religiões como um todo e a uma parte da comunidade científica que insiste em dizer que ciência e religião podem andar juntas.
Ele é claro, preciso e (novamente) elegante em seus argumentos. Algumas vezes é um pouco irônico, mas nunca é desrespeitoso. Então, um livro que poderia ter um tom panfletário se torna uma leitura muito agradável.
Eu, como descrente das divindades como um todo, encontrei nele respostas para muitas perguntas, algumas que eu nem tinha formulado antes. Harris para mim é sempre uma inspiração, seus livros nos fazem sair da zona de conforto e procurarmos olhar além do obvio, além do senso comum. Essa é uma das funções dos livros: nos fazer pensar, questionar o mundo. E esse livro faz isso de forma exemplar.
Num trecho ele escreve:
A resposta à pergunta ‘no que eu devo acreditar e porque’ é geralmente científica. Acredite numa proposição porque é apoiada por teorias e evidencias; acredite porque ela foi experimentalmente verificada; acredite porque uma geração inteira de pessoas inteligentes fez de tudo para falseá-la e não conseguiu; acredite porque é verdade (ou parece ser). Essa é uma norma de cognição, bem como fulcro de toda missão científica. No que diz respeito a nossa compreensão do mundo, não existem fatos sem valores” pp145.
Acho que o mundo vai ser um lugar bem melhor se mais pessoas passarem a usar essas premissas nas suas vidas.

Fonte

Sam Harris faz desafio aos críticos da ciência da moralidade

O neurocientista americano Sam Harris escreveu há três anos o livro The Moral Landscape ("A Paisagem Moral", Cia. Das Letras, R$ 49,50), onde defende ser possível ter uma ciência da moralidade para orientar a humanidade, em substituição à moral ditada pelas religiões ou contaminada pelo dogmatismo das crenças.

Como até agora, no entender dele, nenhum dos críticos do livro apresentou uma argumentação substancial, Harris lançou em seu blog um desafio.

Se alguém lhe mandar um ensaio de até mil palavras provando que a tese do livro está equivocada, que é impossível traçar para a sociedade o que é certo e o que errado a partir do método científico, ele publicará a contestação em seu blog e pagará ao autor US$ 20.000. “[Alem disso] vou retratar publicamente o meu ponto de vista.”

De qualquer forma, mesmo que alguém não consiga abalar a tese do seu livro, ele publicará o ensaio mais bem escrito e pagará ao seu autor US$ 2.000.

Ele convidou o filósofo Russell Blackford, que é um duro crítico do livro, para ajudá-lo na avaliação dos ensaios, de modo a compensar a sua própria ignorância e provável preconceito.

Harris só vai receber as contestações a partir do dia 2 de fevereiro de 2014, porque quer incentivar os seus críticos a fazerem trabalho de qualidade. “Eu não quero receber um monte de rascunhos, ate porque não terei tempo para ler tudo.”

Quando foi lançado, o livro causou polêmica entre religiosos e cientistas. Para estes, a ciência é neutra e, portanto, não pode subsidiar a formação de uma moral.

Harris, contudo, é de opinião de que a investigação científica pode resolver problemas morais, porque o bem-estar humano está relacionado a estados mentais mensuráveis pela neurociência. “Por isso, é possível investigar a felicidade humana.”

Em uma entrevista concedida em 2011, ele criticou a moral que sofre influência das crenças. “O problema com relação à religião é que ela dissocia as questões do bem e do mal da questão do bem-estar”, disse à Veja.

“Por isso, a religião ignora o sofrimento em certas situações, e em outras chega a incentivá-lo. Deixe-me dar um exemplo. Ao se opor aos métodos contraceptivos, a doutrina da Igreja Católica causa sofrimento. É coerente com seus dogmas, embora eles levem crianças a nascer na pobreza extrema e pessoas a ser infectadas pela aids, por fazerem sexo sem camisinha. Através das eras, os dogmas contribuíram para a miséria humana de maneira tremenda e desnecessária.”

Para ele, “as questões morais possuem respostas corretas”.

“Se o bem-estar humano surge a partir de certas causas, inclusive neurológicas, quer dizer que existem formas certas e erradas para procurar a felicidade e evitar a infelicidade. E se as respostas corretas existem, elas podem ser investigadas pela ciência. Chamo de ciência o nosso melhor esforço em fazer afirmativas honestas sobre a natureza do mundo, tendo como base a razão e as evidências.”

Fonte

Uma crítica que bate um pouco mais no livro pode ser encontrada aqui.

Que cês acham?

Link para o comentário
Compartilhar em outros sites

A crítica vai direto no ponto que eu pensei quando vi os exemplos. É fácil explicar moralidade quando não há conflito. Quando o bem-estar de um entra em conflito com o do outro e a solução não é óbvia (como no caso da mutilação) é que o método tem que se mostrar robusto.

Link para o comentário
Compartilhar em outros sites

Não cheguei a ler o livro todo, por isso não vou me alongar mas a resposta simples é não. E a outra, menos óbvia e mais controversa, é que ciência não tem nada a ver com isso.

E já saiu a "resposta" vencedora a algum tempo. Além de vários reviews negativos por aí, seja de filósofos da moral seculares ou não.

Link para o comentário
Compartilhar em outros sites

"Não mate formigas porque está científicamente comprovado que elas ajudam a limpar sujeira da cidade."

Mentira, se você encontrar um monte de formigas na sua cozinha, não pense duas vezes em eliminar o máximo possível desse inseto nojento. Não farão falta.

Link para o comentário
Compartilhar em outros sites

Arquivado

Este tópico foi arquivado e está fechado para novas respostas.

  • Conteúdo Similar

    • grollinho
      Por grollinho
      Tópico dedicado para discutirmos as mudanças climáticas.
      ---
      Terra tem em 2023 o mês de setembro mais quente da história
      Depois de julho e agosto terem sido os mais quentes já registrados, os cientistas afirmaram que 2023 caminha para ser o ano mais quente da história
       
      O planeta Terra teve em 2023 o mês de setembro mais quente da história.
      Foi o maior salto de temperatura de todos os tempos. A média global superou o recorde anterior em 0,5º C, uma margem muito acima da esperada por cientistas. A temperatura do planeta em setembro ficou 1,8º C acima dos níveis pré-industriais.
      De acordo com o serviço de mudanças climáticas Copernicus, o fenômeno climático El Niño, que esquenta a superfície do Oceano Pacífico, potencializou o aquecimento causado pelas emissões de gases. E não para por aí. Depois de julho e agosto terem sido os mais quentes já registrados, os cientistas afirmaram que 2023 caminha para ser o ano mais quente da história.
      No Hemisfério Norte, o verão foi de temperaturas extremas. Um incêndio que devastou mais de 15 mil hectares na ilha espanhola de Tenerife, em agosto, ressurgiu por causa dos ventos fortes e do calor atípico para outubro. O pico mais alto da Europa, o Mont Blanc, perdeu mais de 2 m de altura nos últimos dois anos.
      O início do outono na Europa fica marcado, mais uma vez, por temperaturas altas. A partir de sexta-feira (6), nove regiões de Portugal entram em alerta por causa de mais uma onda de calor. A maior parte do país deve atingir temperaturas superiores a 30º C, bem acima da média para essa época do ano.
    • Leho.
      Por Leho.
      Inteligência artificial criada para prever crimes promete acerto de até 90%
      por Hemerson Brandão,
      publicado em 25 de agosto de 2022
       
      Pesquisadores da Universidade de Chicago, nos Estados Unidos, desenvolveram uma nova IA (Inteligência Artificial) que promete prever crimes com uma precisão entre 80% e 90%. O assunto gerou polêmica por parte de alas da sociedade que questionam essa eficácia.
      Segundo o estudo, publicado na Nature, essa tecnologia tem a função de otimizar políticas públicas e alocar recursos para áreas que mais precisam de assistência policial. O modelo preditivo de IA já foi testado em oito grandes cidades dos EUA, incluindo Chicago.
      O algoritmo funciona a partir do histórico de crimes de uma determinada cidade. Tendo como base registros de eventos disponíveis em domínio público, o sistema analisa o tipo de crime, onde aconteceu, assim como data e hora. Em seguida, a IA usa aprendizado de máquina para gerar séries temporais e prever onde e quando esses crimes ocorrem com maior frequência.
      O modelo pode informar, por exemplo, “provavelmente haverá um assalto à mão armada nesta área específica, neste dia específico”. Porém, isso não significa necessariamente que esse crime ocorrerá de fato.
      Inteligência artificial imita a arte
      Na ficção científica, a capacidade de prever crimes antes que eles aconteçam foi abordada no filme “Minority Report” – estrelado por Tom Cruise e dirigido por Steven Spielberg.
      No longa-metragem de 2002, pessoas eram colocadas na prisão antes mesmo delas cometerem crimes, a partir de um sistema policial batizado de “Pré-crime” – que utiliza uma mistura de tecnologia e paranormalidade para prever e evitar assassinatos. No sistema preditivo ficcional, o suspeito é preso quando ele já está próximo ao local do crime, segundos antes dele cometer o homicídio.
      Porém, na vida real, o professor Ishanu Chattopadhyay — o pesquisador líder do estudo — explica que o algoritmo desenvolvido não tem a capacidade de identificar pessoas que vão cometer crimes ou a mecânica exata desses eventos. A IA prevê apenas os locais que são mais propensos a acontecer crimes.
      Segundo Chattopadhyay, a IA pode ser um aliado para a polícia, pois permite otimizar a logística do policiamento, permitindo intensificar a fiscalização em locais mais propensos a ocorrerem crimes. Ele diz que o sistema não será mal utilizado.
      “Meus companheiros e eu temos falado muito que não queremos que isso seja usado como uma ferramenta de política puramente preditiva. Queremos que a otimização de políticas seja o principal uso dele”, disse o pesquisador à BBC.
      Repercussões
      Porém, conforme lembrou o site IFLScience, algoritmos anteriores já tentaram prever comportamentos criminosos, incluindo a identificação de potenciais suspeitos. O software, claro, foi duramente criticado, por ser tendencioso, não ser transparente, além de gerar preconceito racial e socioeconômico.
      Um grupo com mais de mil especialistas de diversas áreas assinaram uma carta aberta afirmando categoricamente que esses tipos de algoritmos não são confiáveis e trazem muitas suposições problemáticas.
      Nos EUA, por exemplo, onde as pessoas de cor são tratadas com mais severidade do que os brancos, esse comportamento poderia gerar dados distorcidos, com esse preconceito também sendo refletido na IA.
      Como bem demonstrou o filme de Spielberg, o uso de grandes bases de dados para prever crimes pode gerar não apenas benefícios, mas também muitos malefícios.
      @via Gizmodo
      ⇤--⇥
       
      E aí, qual a vossa opinião?
    • Douglas.
      Por Douglas.
      Dois casos:
      Caldense dispensa atacantes Pablo Pardal e João Diogo por indisciplina. De acordo com o clube, jogadores cometeram atos 'incompatíveis com a conduta esperada de atletas profissionais'
      Guardiola defende trio do City flagrado em saída noturna: "Vão ser multados porque não me convidaram". Walker, Mahrez e Grealish aparecem em vídeo no centro de Manchester após jantar, e técnico não vê problemas: "Estou chateado porque não me convidaram"
       
      São casos com condutas distintas, o que tem de similar é que ambos os casos aconteceram em momentos de folga, e a presunção parece ser também a mesma, de que os jogadores têm que se portar de uma certa maneira em todos os momentos.
      "Código de conduta" não é algo restrito ao futebol mas tenho a impressão que é onde isso é aplicado nas condições mais restritivas possíveis. Não sei se não é uma reação desproporcional ao amadorismo folclórico de não muito tempo atrás...
      A gente sabe que resultado ruim no futebol sempre vai ter uma explicação simples e aí jogadores que querem se divertir vão virar alvos fáceis nesses casos, mas não sei se não deveriam ter essa opção. A gente também sabe que se isso for habitual o jogador vai encurtar a própria carreira e também prejudicar o time atual, que é onde acho que isso acaba sendo visto como justificado, porque se um atleta de modalidade individual quiser se acabar na noite ele só prejudicaria a si.
       
      Aí entra o outro caso do City que é quase uma nota de rodapé ali:
       
      Entendendo que nesse outro caso a advertência foi por causa do horário, já parece uma ação mais ponderada que multar jogadores por um jantar ou dispensar jogadores por beberem e fazerem molecagem durante o dia de folga.
      Trazendo pro FM, que também tem seu código de conduta mas que vai mais nessa linha, de que você (agindo pelo clube) deve cobrar as obrigações no campo e em treinamentos.
      E tudo isso dentro do escopo de ações comuns e não (possivelmente) criminosas, que aí entraria numa discussão diferente de ferir a imagem do clube por tabela. Robinho, Danilo Avelar, etc.
       
      Enfim, é um caso que já tinha achado curioso quando veio a notícia do City mas que pega outro rumo quando falamos de clubes pequenos, porque no caso de clubes grandes daria pra argumentar que o regime especial faz parte do pacote de serem pagos como exceções entre exceções, mas isso não se aplica em clubes menores e aí eu tenho que pensar se todo clube que paga salário mínimo pra contrato de 3-4 meses vai também cobrar regime de concentração 24/7...
    • Ariel'
    • Dinheiro Tardelli
      Por Dinheiro Tardelli
      Mais um triste capítulo da nossa história.
×
×
  • Criar Novo...