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A saga do Boston River no Peru: Não é preciso check-in para entrar na história


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A saga do Boston River no Peru: Não é preciso check-in para entrar na história

por Douglas Ceconello 

O modesto Boston River é o último uruguaio remanescente na Copa Sul-Americana. A permanência é ainda mais heroica porque a vaga veio após uma epopeia para chegar (e depois voltar) a Huancayo, na serra peruana, onde o elenco charrúa enfrentou o brioso Comerciantes Unidos, na última quinta, em mais um daqueles confrontos maravilhosamente aleatórios que a Sula nos proporciona. 

Sucede que os voos de linha que saíam de Lima a Jauja, cidade próxima ao local do embate, chegariam muito em cima do jogo. Então, a comitiva do Verdirrojo não viu alternativa senão embarcar em um avião MILITAR, que obviamente não conta com aquelas condições que imaginamos quando se pensa numa viagem de um clube de futebol. E lá se foram os uruguaios, sem lenço, sem documento. Sem check-in e, aparentemente, sem medo. 

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Ou talvez o tamanho da aventura tenha ficado claro para os uruguaios apenas no momento em que, munidos das inseparáveis cuias e garrafas térmicas, sentaram-se de frente uns para os outros, sem cintos de segurança e ouvindo o barulho atroz das turbinas, como se fossem não decidir uma classificação no campo, mas desembarcar na Normandia para instalar o Mujica Way of Life. "Quando subimos no avião, me assustei", declarou ao Ovación o presidente do clube, Sergio Pérez Lauro. 

Para completar a jornada rumo ao estádio, 3200 metros mais perto de Deus, ainda se deslocaram de BICITÁXIS que levavam poucos jogadores de cada vez e serpentearam de ônibus pelas sinuosas entranhas da serra peruana. A saga uruguaia é mais um daqueles episódios que, para além do espírito aventureiro, indica que nem sempre são ideais as condições logísticas quando os times precisam desbravar o continente na Libertadores ou na Sul-Americana, situação que infelizmente ficou evidente após o acidente da Chapecoense.

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Tanto melhor quando apenas a aventura entra para a história. A empreitada por terra e ar valeu a épica classificação, obtida após empate em um gol diante dos peruanos (na primeira, o time de La banda havia vencido por 3 a 1). Apesar dos 78 anos, o clube estreou na primeira divisão uruguaia apenas em 2016, e já de cara conquistou uma vaga na Sul-Americana. Ali, os caminhos da América foram apresentados ao clube fundado no bairro de Bolívar, em Montevidéu (cujo nome, aliás, é uma mistura de homenagens - Boston faz referência a uma ALFAIATARIA e River é uma alusão ao gigante argentino, para quem torcia o primeiro presidente do clube uruguaio). Desde a última semana, El Boston é candidato ao menos ao título de Más Viajero de 2017.

As imagens são do perfil do clube no Twitter.

http://globoesporte.globo.com/blogs/especial-blog/meia-encarnada/1.html

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Esses dias tinha uma equipe inglesa (ou torcida dela, enfim) reclamando que precisou viajar 350 km pra algum jogo de play-off aí...

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11 horas atrás, Danut disse:

Esses dias tinha uma equipe inglesa (ou torcida dela, enfim) reclamando que precisou viajar 350 km pra algum jogo de play-off aí...

Casos como o do Boston River e do Atlético Tucumán só provam o quanto uma atitude dessas é ridícula!

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11 horas atrás, Danut disse:

Esses dias tinha uma equipe inglesa (ou torcida dela, enfim) reclamando que precisou viajar 350 km pra algum jogo de play-off aí...

Por isso que eu falo que se convidar Barcelona, Real Madrid, Chelsea ou outro time grande e de grife da Europa pra jogar a libertadores, não se cria. Libertadores é muito mais que bola no campo. A parada é uma puta guerra psicológica desde o momento em que se sorteiam os grupos, e a Sulamericana chega a ser mais hardcore ainda.

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  • Vice-Presidente
12 horas atrás, Ichthus disse:

Casos como o do Boston River e do Atlético Tucumán só provam o quanto uma atitude dessas é ridícula!

Porque é completamente justo comparar a minúscula Inglaterra com um continente.

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Em 2017-6-7 at 01:21, Danut disse:

Esses dias tinha uma equipe inglesa (ou torcida dela, enfim) reclamando que precisou viajar 350 km pra algum jogo de play-off aí...

O que eles tavam reclamando era de que o jogo era em dia de semana, não da distância em si. Boa parte da torcida não conseguiria ir por que perderia dia de trabalho.

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8 minutos atrás, Darknite disse:

O que eles tavam reclamando era de que o jogo era em dia de semana, não da distância em si. Boa parte da torcida não conseguiria ir por que perderia dia de trabalho.

A que eu vi não era isso, não. Tô ligado nesse negócio dos jogos em dia de semana, e aí eu concordo. Pro torcedor que quer acompanhar o time e tal é muito ruim jogo em dia de semana mesmo. 

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16 horas atrás, Danut disse:

A que eu vi não era isso, não. Tô ligado nesse negócio dos jogos em dia de semana, e aí eu concordo. Pro torcedor que quer acompanhar o time e tal é muito ruim jogo em dia de semana mesmo. 

Pode ser que estejamos falando de casos diferentes, mas eu acho que é o mesmo, hahaha.

O que eu to falando é de Carlisle x Exeter, da 4ª Divisão. Carlisle fica no norte da Inglaterra, enquanto que Exeter fica no sudoeste.

O jogo de ida dos playoffs foi em um domingo, em Carlisle e o jogo da volta era na quinta-feira, em Exeter.

Aí a torcida do Carlisle tava chiando porque o jogo era em dia de semana, contra um dos adversários mais distante possível. Se fosse algum adversário mais próximo, rolaria tranquilamente de ir e voltar no mesmo dia.

Resumo: O motivo da reclamação era da distância E por ser em dia de semana. Se fosse só um dos dois, não daria reclamação.

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2 horas atrás, Darknite disse:

Pode ser que estejamos falando de casos diferentes, mas eu acho que é o mesmo, hahaha.

O que eu to falando é de Carlisle x Exeter, da 4ª Divisão. Carlisle fica no norte da Inglaterra, enquanto que Exeter fica no sudoeste.

O jogo de ida dos playoffs foi em um domingo, em Carlisle e o jogo da volta era na quinta-feira, em Exeter.

Aí a torcida do Carlisle tava chiando porque o jogo era em dia de semana, contra um dos adversários mais distante possível. Se fosse algum adversário mais próximo, rolaria tranquilamente de ir e voltar no mesmo dia.

Resumo: O motivo da reclamação era da distância E por ser em dia de semana. Se fosse só um dos dois, não daria reclamação.

Não lembro mais qual era. Pode ser que tu tenha razão, pensando agora.

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    • Iagotta
      Por Iagotta
      Onde a terra treme: o Clássico da Villa Crespo
      Por Douglas Ceconello
      Esta é uma história sobre como módicos oito quilômetros podem gerar uma rivalidade impossível de ser medida. Na última terça-feira, diante de 20 mil torcedores, o Chacarita Juniors, um dos clubes mais tradicionais do futebol argentino, sacramentou seu retorno à segunda divisão nacional, após dois anos amargando uma peregrinação pelo terceiro escalão. Mais do que isso, retorna após grande trajetória em um campeonato no qual venceu por duas vezes seu tradicional rival, o Atlanta, que permanece na Terceirona após uma temporada lamentável. Mesmo separados de vizinhança, inclusive em cidades diferentes, os times disputam o clássico da Villa Crespo, um dos mais representativos, acirrados e tensos do futebol castelhano – estes quilômetros de distância, aliás, são um dos principais componentes que exacerbaram a rivalidade ao longo dos tempos. Porque um dia, tempos atrás, ambos eram vizinhos de quadra, janela com janela, até que sucedeu um evento terrível, cravejado pelos pontiagudos pregos da mais requintada crueldade, que acabou esfolando para sempre a alma do Chacarita e arremessando o clássico para a eternidade.
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      O que sucedeu, naquela época em que se via os jogos em SÉPIA, foi o seguinte. Nascido no bairro que dá nome ao clube, o Chacarita mandava seus jogos no bairro vizinho, a Villa Crespo, mas com o tempo sentiu a necessidade de construir um estádio maior. Então, em 1933, na frente de sua antiga cancha, do outro lado da Rua Humboldt, levantou sua nova casa, portentosa para a época, erguida por jogadores, dirigentes e torcedores, como ocorria com frequência naqueles tempos de candura. Acontece que pouquíssimos metros ao lado, na mesma rua, ficava o estádio do Atlanta, então um clube de maior pujança financeira e desportiva. O estádio dos funebreros (apelido do CHACA que faz referência ao cemitério de Chacarita, o maior de Buenos Aires) era bastante maior e mais confortável que a casa do rival Atlanta. O Chacarita passou a viver tempos áureos, desfrutando de sua reluzente moradia e protagonizando grandes MATCHES na elite do futebol castelhano. Só havia um porém, que logo mostrou carregar em seu ÂMAGO a origem da desgraça: o estádio estava situado em um terreno alugado.
      Para nós pode parecer um pouco incompreensível, mas o futebol de bairro é muito forte em Buenos Aires. Os clubes portenhos movimentam as vizinhanças, suas paixões e sua vida social, mesmo em canchas muitas vezes acanhadas, bem aquém da grandiosidade dos considerados grandes do futebol nacional. Não raras vezes colocam públicos maiores que jogos da primeira divisão brasileira. E, mais importante, a noção de PERTENCIMENTO a um bairro é algo muito sério para os clubes de lá, já que cada vizinhança possui raízes e mitologia próprias (basta vermos a recente epopeia do San Lorenzo para voltar a Boedo). Certa vez, perguntei a um taxista de Buenos Aires para que clube torcia, ele respondeu “Atlanta” e se surpreendeu, talvez até duvidou, que eu sabia da existência do time. Não importa em que divisão ou situação financeira esteja – se um portenho torce para o COLEGIALES, torcerá para sempre. Este taxista inclusive tinha uma curiosa explicação sobre o Atlanta jogar a terceira divisão: “Não querem subir porque se gasta muito dinheiro para fazer time. É melhor ficar lá”. Tanto Atlanta como Chacarita sempre foram clubes tipicamente portenhos, daqueles cujos áureos tempos hoje são lembrados com nostalgia quase lacrimejante pelos senhores sentados em bodegones entre um café e um whisky, sem se importar com questões menores e amargamente tangíveis, como a divisão que o time frequenta atualmente ou a quase sempre periclitante situação financeira.

      Atlanta e Chacarita, antigamente vizinhos de janela.
      Naquela época do ACONTECIDO, início dos anos 1940, apesar da proximidade, a rivalidade entre os clubes poucas vezes entrava em campo, já que costumavam frequentar diferentes divisões do futebol argentino. A rivalidade, no entanto, logo recebeu uma jorrada de gasolina que jamais cansou de queimar. Sabedores que o Chacarita estava com o aluguel do terreno do seu estádio atrasado, coisa de seis meses, algo assim, o Atlanta, por meio de famílias ricas vinculadas ao clube, fez uma proposta ao proprietário da área e, depois dos trâmites legais, COMPROU o estádio do adversário, já que o Chacarita não tinha condições de cobrir a proposta. A história é contada por Alejandro Fabbri, no livro El nacimiento de una pasión - Historia de los clubes de fútbol.
      O Funebrero chegou a se negar a abandonar o lugar, mas após espernear acabou deixando sua casa. Para piorar, em seu último jogo no bairro, em novembro de 1944, levou um sacode de 7 a 2 do próprio Atlanta, na casa dos bohemios, ali do lado, no chamado jogo da "expulsión". "Eran los vecinos nuestros, los mandamos a San Martín...", diz um dos cantos da torcida do Atlanta, que até hoje faz troça e ao mesmo tempo parece sentir falta de olhar para o lado e ver todos os dias o rival de sempre. E, como tristeza não tem fim, pouco depois toda a gente funebrera ainda precisou assistir, com os olhos que a terra do cemitério da Chacarita há de comer, ao Atlanta demolir sua antiga casa para expandir seu próprio estádio por cima. Em 1960, era inaugurado o Estadio Don León Kolbowsky, nova casa bohemia.

      A nova casa do Atlanta, erguida sobre o estádio do Chacarita. Dizem que às vezes a terra treme.
      Como nos anos 40 já era impossível encontrar nas redondezas uma área adequada para erguer um novo estádio, o CHACA, despejado e traumatizado pela ditadura do IPTU, foi obrigado a mudar de cidade, passando a jogar em San Martín, na Grande Buenos Aires, onde até hoje manda suas partidas. São oito quilômetros em linha reta, 11 por meio de AUTO, mas uma distância daquelas que jamais serão totalmente percorridas, não importa o quanto se ande. Aliás, este problema de não conseguir construir estádio em seus domínios em Buenos Aires não é exclusividade do Chacarita; pelo mesmo motivo, o Almagro, por exemplo, também joga fora da cidade. Mas a circunstância do perrengue na Villa Crespo, esta sim, é única. Porque é impossível pensar em uma AFRONTA maior e mais sádica do que ser expulso de seu próprio bairro, de sua própria cidade, para ver seu rival mais íntimo SOTERRAR sua casa e passar a morar em cima - cada vez que o Chacarita visita o rival na Villa Crespo está jogando sobre o que um dia foi seu próprio estádio.

      Ainda não inventaram sistema de medida capaz de compreender esta distância.
      O clube fez questão de manter seu vínculo com a vizinhança, tanto que até hoje sua sede social está localizada na Chacarita. Naturalmente, sendo o único clube da zona, o Atlanta angariou muito mais adeptos nos anos seguintes, mas parte da população dos bairros de Chacarita e Villa Crespo continuou fiel ao Funebrero e costuma realizar a pequena viagem para ver a equipe jogar em San Martín, a noroeste da capital federal. Devido ao macabro evento da década de 40, a rivalidade cresceu de forma inversamente proporcional à proximidade entre os clubes. Basta assistirmos, por exemplo, ao vídeo abaixo, que mostra a incontida comemoração na sede do Atlanta quando o Chacarita foi rebaixado de forma MEDONHA para a Terceira, em 2012, perdendo um pênalti nos acréscimos do segundo tempo diante do Nueva Chicago, em mais um daqueles desfechos INFARTANTES que a terceira divisão argentina costuma proporcionar.
      Até hoje, quando ocorre o Clássico da Villa Crespo, sendo ou não jogado na Villa Crespo, a mobilização policial é forte, porque a tensão e a animosidade são ingredientes constantes – no percurso que construiu a rivalidade, restaram no caminho encontros épicos que ignoraram divisões, mas sobretudo a relação conflitante de vizinhos que se despediram de forma dramática e uma casa construída por cima da outra, que de alguma forma ainda está lá, como apregoam as pichações dos funebreros nas cercanias da Rua Humboldt. Desde a decisiva desavença imobiliária, este antagonismo passou a latejar cada vez mais forte, mesmo quando os rivais passam largas épocas sem se enfrentar por frequentarem divisões diferentes. Não é Avellaneda, Istambul, Montevidéu ou Porto Alegre. É apenas a Villa Crespo, com um estádio real em cima de um outro estádio cuja presença ainda se sente, soterrado e ao mesmo tempo ETÉREO. E algo desta natureza é impossível de medir.
       
      @Meia Encarnada
    • Iagotta
      Por Iagotta
      O clássico proibido de Mar del Plata
      Por Douglas Ceconello 
      Neste final de semana, Real Madrid e Barcelona se enfrentam para disputar a Supercopa da Espanha. O jogo entre os gigantes espanhóis é uma espécie de Disney World do mundo dos clássicos, com estádios apinhados de turistas, transmissão para o mundo inteiro, os maiores jogadores do mundo envolvidos. Como rivalidade em si, é um chá de camomila temperado pelo marketing, e pelo mundo há centenas de confrontos mais apimentados. Do lado extremamente oposto no espectro da rivalidade, sem televisão, nem glitter, nem Mickey Mouse, desconhecido de quase todos, está o clássico de Mar del Plata, cuja rivalidade envolvida é tão crespa que o jogo sequer é disputado: neste 10 de agosto fez exatos VINTE anos que Aldosivi e Alvarado encontraram-se pela última vez num campo de futebol. A raiva nutrida e bem regada entre as diminutas torcidas e a previsão de doses cavalares de violência impedem que os clubes se enfrentem mesmo em amistosos. 

      (Capa do jornal El Atlántico, de Mar del Plata, na última vez que Aldosivi x Alvarado se enfrentaram. Origem da foto: Twitter do Código de Barras)
      A última vez que se cruzaram, em 1997, deixou como legado um enorme e aparentemente insolúvel trauma na cidade, distante 400 quilômetros de Buenos Aires. A partida pelo torneio local foi repleta de intermináveis incidentes com a torcida, bombas de gás lacrimogênio, correria intensa pelas ruas do balneário e um muro do estádio derrubado, que deixava os jogadores vulneráveis para qualquer mudança de HUMOR da torcida — "Se fizéssemos um gol, matariam todos nós", disse Martín Gallo, então jogador do Aldosivi. A "Pérola do Atlântico", oásis de águas geladas que no verão sacia a fissura dos argentinos por praia, se tornara o epicentro do caos, uma Sodoma futebolística às margens do oceano. O juiz não viu alternativa que não encerrar o jogo aos 30 minutos do primeiro tempo. Foi o derradeiro Aldosivi x Alvarado na história, com apenas um terço da partida disputado.
      Conforme texto do jornalista Andrés Burgo no jornal Página 12, em 2011 a AFA queria reorganizar a Copa Argentina e resolveu tirar uma FEBRE com os responsáveis pela segurança nos principais centros de futebol do país para a realização de clássicos. Recebeu carta branca para cruzar Newell's e Rosário Central, cujos encontros são praticamente uma guerra civil dentro do campo, ou Boca Juniors e River Plate, uma das maiores rivalidades do mundo, e também Gimnasia e Estudiantes de La Plata, que praticamente acionam as placas tectônicas quando se encontram na Ciudad de Las Diagonales. Mas em Mar del Plata não é bem assim. Em Mar del Plata, ouviram basicamente um LO SIENTO: não seria possível organizar um Aldosivi x Alvarado, em qualquer hipótese. Boca Juniors x River Plate é uma quermesse de escola perto do antagonismo vivenciado pelos toritos do Alvarado e pelos tiburones do Aldosivi.
      O primeiro clássico marplatense aconteceu em 1954, mas os ânimos se acirraram de maneira irreversível na década de 1990, quando aconteceram vários embates por torneios das divisões inferiores da AFA e também partidas decisivas pela Liga de Mar del Plata. Imagens daqueles delirantes encontros noventistas evidenciam o clima demente que acompanhava os jogos: estádios módicos e fumaceira constante, bombas pipocando inclusive no campo e, dentro do gramado, disputas que flertavam perigosamente com a CRIMINALIDADE, sendo que lá pelas tantas aparece num vídeo um jogador do Alvarado praticamente arrastando o adversário pelos CABELOS depois que este atinge com brutalidade um companheiro seu. 
      As feridas nunca cicatrizaram após aquele 10 de agosto de 1997. Na verdade, sangram de maneira cada vez mais pungente. Nem a possibilidade de um amistoso entre EX-JOGADORES é vista com bons olhos: faz um par de anos, veteranos de ambas as equipes tiveram que abandonar a ideia de um jogo festivo para arrecadar dinheiro para um HOSPITAL, tal era o clima bélico que começava a surgir nas redes sociais. E, para deixar a situação ainda mais surreal, muitos destes que hoje se inflamam na internet ou se pegam nas esquinas da cidade litorânea ou mesmo se engalfinham como milanesas selvagens na areia da praia não eram sequer NASCIDOS quando os times se encontraram pela última vez na cancha.

      A esperança de um futuro menos turbulento está na piazada. (Foto do El Retrato de Hoy)
      A promessa de caos e violência fez com que os confrontos inclusive pela liga marplatense fossem evitados. Como ambos os times frequentam divisões diferentes há muitos anos, também não se encontram nos torneios da AFA, ainda que agora isso esteja PERIGOSAMENTE próximo de acontecer: com a queda do Aldosivi para a segundona, basta que o Alvarado suba uma categoria para que o mar gélido do balneário alcance temperatura de fervura e até os lobos marinhos fiquem com o pelo eriçado. O futuro, no entanto, parece menos sombrio: nas categorias de base ainda é possível ver as tradicionais cores em lados opostos dentro de um campo e convivendo de maneira cordial e fraterna.
      Não deixa de ser irônico que a cidade para onde acorrem milhares de argentinos no verão, período em que tem sua população quadruplicada e recebe os famosos clássicos de pré-temporada, que colocam frente a frente os maiores clubes do país, não consiga realizar seu encontro mais representativo, modesto e ao mesmo tempo incomparável, desconhecido do mundo, impraticável e hoje fantasmagórico. O encontro que, por caminhos medonhos, elevou a rivalidade à sua quintessência: um antagonismo que cresce à medida em que os times não se enfrentam.
       
      @Meia Encarnada
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